A VIAGEM
E a cada momento de reflexão deparo-me com a minha mente a pensar e a culpar o medo, pelos momentos menos bons da minha vida.
Medo do que os outros vão pensar, medo de perder algo ou alguém, medo de sentir coisas novas, medo da dor infligida ou auto-infligida, medo da culpa, medo do arrependimento, medo do desconhecido, medo de errar, medo de SENTIR. Tantos medos. Ter medo e normal. Ultrapassar os meus medos, um a um será talvez, o maior acto heróico de sempre, na minha vida. O medo faz-me sentir presa de movimentos. Ata-me os pés e as pernas acima de tudo, impede-me de ser feliz verdadeiramente. Perder os medos vários tornou-se então um dos meus objectivos primários na vida. Enquanto não soltar as amarras que me impedem de me movimentar e viver, não sairei daquele quarto pequeno a que me habituei a estar tão segura e confortável, aquilo a que aprendi que tem um nome - zona de Conforto. Lá sentia-me protegida de tudo e de todos, ou de quase tudo e de quase todos.
Ate que um dia ao ler um livro que me chamou a atenção pelo seu conteúdo, me senti confusa e perdida. Tinha adorado ler aquele livro e estava com uma sede imensa de ler cada vez mais e mais e mais, porem havia uma única coisa, naquele livro que não concordava, e isso colocou-me a matutar sobre o assunto. Eu não concordava com o autor, quando dizia que uma das regras para se sentir feliz era SENTIR a paixão. Estar apaixonado, ser apaixonado, sentir paixão pela vida, pelas pessoas, pelas coisas que se fazem diariamente, por nos próprios. Eu não sentia isso e achei que ele estaria certamente a exagerar ou então que seria um sortudo, pois ter e sentir tudo isso, nesta vida, era coisa de sortudos e de pessoas que nasceram para serem felizes, apenas. Mas o facto de tudo o resto se encaixar com a minha forma de pensar a vida, e mais precisamente a minha vida, fazia-me ainda assim, mais confusão. Comecei a pensar quando teria sido a ultima vez que tinha sentido aquele sentimento - a paixão!!!- que estava eu, já, a invejar sentir? Eu também queria sentir aquilo. Queria novamente acordar de manha e saltar fora da cama, com todo o meu corpo e mente em sintonia e a saltar de alegria por estar viva e poder fazer tudo aquilo que eu adorava na minha vida. Lembrei-me quando senti essa paixão. Tinha eu entre os meus 19 e 20 anos. Trabalhava num infantário e ganhava mal, mas o que ganhava dava para mim e as minhas despesas. Acordava com a sensação de que não ia trabalhar, mas antes ver os meus meninos, como carinhosamente eu dizia e sentia. Vivia com os meus pais e namorava já com o meu marido. Alias, vivia o meu trabalho a 100% e vivia o meu tempo livre a pensar nele. Era apaixonada pelo meu trabalho e pelo meu namorado e tudo o resto passava-me ao lado. Pensava em seduzir e ser seduzida. Pensava em sexo. Pensava nos meus meninos. O resto era secundário. Na altura sentia-me mais bonita que nunca antes e sentia-me mais viva que nunca. Agora percebo que eu já na altura era toda emoções e estava certa, toda a minha vida era paixão e toda eu era felicidade. Irradiava brilho e luz. Ofuscava mesmo.
Percebi que esse sentimento realmente de paixão fora o sinonimo de felicidade para mim, como tinha efectivamente lido no livro. Afinal a paixão fazer parte da felicidade como um ingrediente fulcral, não era exagero do autor. Tinha sido assim comigo antes, eu tinha vivido exactamente isso. Agora já tinha inveja da minha vida desses dias e queria viver esse estado de novo. Queria estar apaixonada novamente e sentir-me viva novamente. Isso teria que passar por longas conversas com o meu namorado da altura, meu actual marido. Toda uma bagagem de anos e anos acumulada naquela gaveta que tem um letreiro imaginário que diz ''coisas mal resolvidas'', teria que mudar e todas as coisas mal resolvidas teriam que se resolver. Custasse o que custasse. Percebi rapidamente que na altura era uma miúda cheia de sonhos. Percebi que tinha um segredo em mim. Simplesmente sempre acreditei que fosse de que forma fosse eu ia ter os meus sonhos. E assim tem sido, sempre desde então, realmente. Instintivamente não penso em como chegar lá, apenas guardo a imagem do que quero e luto por isso. A verdade e que tenho conseguido alcançar todos os meus sonhos, ou praticamente todos. Não sonho com o totoloto ou afins, nada disso. Mas penso em conseguir a pulso e com um factor chamado sorte e outro determinação, para lá chegar. Percebi que me estava afundar, como um autentico navio que navega sem comandante. Não percebia o que fazia a minha vida,nem o meu navio moverem-se. O que seria o comandante ou quem? Não era eu, achei... Eu sentia que já tinha chegado a todos os meus sonhos, que já conseguira tudo o que sempre quis, por muitos e muitos anos, e que por isso, não me poderia atrever a sonhar com mais nada. Eu estava-me a anular, sem sequer me ter dado conta. Eu estava a impedir-me de sonhar mais e mais alto, porque olhava para os outros. Eu estava a parar de viver porque os outros não tinham o que eu tinha da vida. Precisei de tempo para processar tudo isto. Precisei de perceber que o que Deus tinha destinado a cada um de nos, seria algo que me iria ultrapassar sempre infinitamente. Que Ele ainda tinha planos para mim, ou eu e a minha vida já não estaríamos aqui. Percebi que o colocar-me em primeiro lugar fez-me mais sentido do que nunca. A minha vida era tão especial como a de qualquer outro ser humano, aos olhos Dele. Portanto eu teria que fazer a minha parte e aceitar o que Ele teria reservado para mim. Percebi que a mim só me compete uma coisa, SONHAR E ACEITAR.
Deixar-me sentir tudo e combater os medos, ou seja, ir-me desamarrando dos medos a medida que vou querendo viver com paixao. So assim me conseguiria imaginar a viver plenamente e feliz.
Tive que me permitir sonhar. Acreditar no meu mais profundo ser, que consigo aquilo a que eu própria me permiti sonhar. A que me propus fazer.
Quis sair da minha zona de conforto e bater de frente com o mundo, mas viver em pleno e nao em medo.
A medida que o fazia, fez-me imensa confusão o meu estado de zombie e os outros zombies que andam por ai a fazer que vivem. Apetecia-me dar-lhes um abanão, mas fui ganhando a moderação que tanto preciso para determinadas coisas da minha vida e percebi que como eu mesma tive que me achar, cada um terá que se achar também. Não adianta tentar influenciar ninguém, se não estiverem preparados para esta viagem. E preciso ter as bagagens já prontas e estar dispostas a entrar nela, ou melhor, querer entrar nesta viagem, de um só sentido. O da mudança. O de nos reencontrarmos a nos mesmos. A viagem que nos leva ao encontro da felicidade plena. Claro que tenho a noção de que haverão momentos difíceis pelo caminho. Faz parte. Como os solavancos de um avião, a cada bolsa de ar. São normais. Sabemos disso antes de embarcar. Mas quando estamos preparados para aceitar as dificuldades que sabemos que vamos encontrar, ficamos mais fortes e mais resistentes a elas. Não sabemos quando, nem como, nem onde, mas serão inevitáveis. Porem sairemos, sairei tão mais forte, mas tão mais forte, que anseio esta viagem, de uma forma inexplicável. Tal qual aquela menina de 19 anos, em que sentindo-se apaixonada, tudo o resto passava serenamente ao lado, porque a coragem com que enfrentava tudo era fascinante e de fazer inveja a qualquer um. Inclusive a mim própria, 20 anos depois. Fui ao fundo de mim e encontrei as minhas paixões e pedi ajuda para encontrar a moderação que precisava. Renasci e apaixonei-me de novo pelo meu marido, pela minha vida e pelo caminho que queria seguir, depois de traçar as minhas metas, para atingir os meus sonhos. Soltei-me de muitos medos e tabus. Derrubei barreiras que não pensei que existissem e que ate algumas estivessem lá. Tenho ainda tantas outras pela frente, eu sei. Mas a forma como as derrubarei, jamais será a mesma, pois agora tenho algo em mim que não tinha antes. Chama-se confiança em mim mesma e amor próprio. Sentindo no presente, uma humildade de forma diferente, sei que ainda tenho imenso que quero aprender. Quero agarrar a vida de uma forma apaixonada, com todas as forcas que tiver em mim.
Finalmente percebi que só assim me sinto realmente viva.